Ivandro Silveira

Pin It

Por que Skate?

Acho que não é o cara que escolhe o skate, é o skate que escolhe o cara.

Se o cara decide comprar um skate, aprender a andar como outros skatistas e se vestir como eles, chega um momento que isso acaba para ele, nas primeiras quedas, nas primeiras lesões, nas primeiras derrotas, nas primeiras novas oportunidades de vida alheias ao skate.

Mas quando o cara comunga numa comunidade de skatistas, anda de skate pela primeira vez com um skate que pega emprestado, ganha seu primeiro skate usado, aprende a andar, não como outros skatistas, mas fazer coisas que nenhum outro skatista fez até então, quando o cara abre mão de muitas oportunidades de vida alheias ao skate, aí o skate te escolhe e te dá a força pra superar as quedas, as lesões, te dá a sabedoria para aprender com as derrotas, o cara passa a respirar, dormir, sonhar skate e quando se dá conta a sua alma é do skate, isso é ser um skatista de alma.

Campeonatos

Sempre existiram skatistas que quebravam nos treinos mas na hora da competição não eram tão competitivos ao ponto de chegar a uma final, ou ainda mais, vencê-la em meio a tantos skatistas de alto nível.

Mas competir é uma sensação diferente, boa e ruim ao mesmo tempo. Ruim porque te coloca a prova, contra outros skatistas e contra você mesmo, e isso é o mais difícil, vencer a si mesmo, vencer os seus medos, tomar as decisões corretas, na hora correta, sem ter ninguém pra te ouvir, até porque, diferente de outros esportes, os skatistas não costumam usar treinadores.

Nas competições de street, bowl park, half pipe, o cara é julgado e a complexidade desse julgamento faz com que o cara, muitas vezes, se sinta prejudicado, mal julgado, injustiçado e essa sensação de injustiça é muito ruim, mesmo que o cara não tenha a razão.

E isso é diferente no DH Skateboard. O sentimento de Racing, de corrida mesmo, de pilotagem, saindo de um ponto em condições iguais e tendo só o objetivo de atingir outro ponto, cruzar a linha de chegada, na frente, ou mesmo a milésimos de segundo de outro Rider, me trouxe uma sensação melhor de competição, tão boa que é comun vermos caras comemorando uma derrota, e foi isso que fez com que eu me voltasse tanto para o DH Skateboard depois de anos competindo no Street Skate.

 Definição de skate 

Tentar definir o skate é como tentar definir o indefinido, o indefinitivo.

O skate de ontem não é o mesmo skate de hoje e não é o mesmo que se vai andar amanhã.

Aquilo que caras como Nyjah, Kelvin, Luan, e todos esses caras que quebram no Street League fazem, é algo completamente impensado para a minha época e acredito que um novo nível divisor de águas é já inquestionável.

Aquilo que não muda são os princípios, as essências do skate, de ontem, de hoje, de sempre. A eterna busca por criar manobras que ninguém fez, pular escadas que ninguém pulou, descer corrimões que ninguém desceu, implementar novos estilos, naquilo que é o skate, e o que eu quero dizer é que o skate não é só um esporte, mas principalmete um estilo de vida.

Um estilo de vida que te traz conquistas, vitórias, crescimento, conhecimento, intelecto que não se encontram nas pragmáticas salas de aula, coragem, superação.

Um estilo de vida capaz de construir famílias, onde pais e filhos crescem juntos, se educam juntos, erram juntos, mas que se amam muito. Um estilo de vida capaz de te levar a vários lugares do mundo que o cara nem sonhou, conhecer pessoas como você e que vão se tornar parte de sua família, e assim, com o passar dos anos, o cara ganha uma família muito grande e muito especial, a Família Skateboard.

E essa família, essa irmandade, também vem evoluindo junto com o esporte. Hoje streeteiros, speedeiros, bowl, slalom, vertical, mega ramp,  todo mundo admira um ao outro, sem pré-conceitos, os rivais se tornarão irmãos, para crescerem juntos.

E se hoje o Brasil domina a cena do DH Skateboard Mundial com 8 títulos mundias nos últimos 9 anos, no bowl park com Pedro, Murilo, Luizinho e todos esses caras, isso enquanto ainda se vive a história escrita por Bob, Digo, Mineirinho, Ueda, Roni e tantos outros, é porque existiram pessoas que trabalharam muito para tornar isso possível e eu acredito que o Brasil já entendeu isso há algum tempo.

Não é de hoje que a Confederação e os membros dessa grande família vêm reconhecendo os esforços feitos por essas pessoas, os anos de vida dedicados por esses 'skatistas de alma' e tentando fazer com que as novas gerações não esqueçam nunca de suas raízes, mas que, por sua vez, sejam reconhecidos pela velha geração pelos novos feitos que eles vem alcançando.

E isso não pode parar, isso é o que devemos continuar fazendo pelo skate, ontem, hoje, amanhã, porque eu acredito que é só assim que vamos nos manter no topo da elite mundial em muitas modalidades.

O skate me fez o que eu sou, em tudo na minha vida ele sempre esteve presente, me ensinou a perder e aprender a vencer com a dor de errar. Me trouxe muitas coisas boas, difícil dizer qual foi a melhor, receber uma notificação da IGSA te declarando 2017 IGSA DH SKATEBOARD GRAN MASTER WORLD CHAMPION, receber uma medalha de mérito esportivo na Assembléia Legislativa da cidade que eu nasci ao lado de minha mãe, ganhar o Certificado de Campão Brasileiro DH Skateboard Gran Master das mãos de Bob Burnqvist,  ter um pouco da sua história contada por caras como Guto Gimenez e Hélio Greco.

É óbvio que essas conquistas não caem no seu colo em um dia de sol qualquer, elas se formam ao longo de anos à um alto preço. É preciso muita dedicação, muita persistência, muita superação, é preciso abrir mão de muitas coisas na vida para escrever sua história em um esporte tão perigoso, desafiador e fatal, afinal de contas o DH Skateboard está entre os 10 esportes que mais mata no mundo.

É preciso superar lesões, traumas, cirurgias, medo, tensão, ingredientes típicos dos Extreme Sports e dos Gravity Sports e é esse o preço mais alto, porque sua família espera por você, espera você voltar pra casa, bem, vivo, e a sua Família Skateboard espera por você no próximo campeonato, na próxima session, na próxima trip, no próximo churrasco.

Depois de uma queda grave na semi final da primeira etapa do Circuito Brasileiro da CBSK de 2016, fraturei o úmero, já passei por 3 cirurgias de risco, hoje uso uma prótese e perdi parte dos movimentos do braço esquerdo, convivo e vou conviver com dores crônicas. Consigo levar uma vida praticamente normal mesmo com a deficiência e, prestes a completar 50 anos continuo andando rápido e preparado para competir.

Então fica fácil dizer qual a pior coisa que o skate já me trouxe, mas se eu tiver que escolher 1 só coisa como a melhor coisa que o skate me trouxe, eu escolho a oportunidade que tive de trabalhar como diretor de prova 'IGSA Official' ao lado de um dos meus maiores ídolos como atleta e pessoa, Mestre Alexandre Maia e narrar campeonatos de DH Skateboard para tentar contar um pouco das histórias dos Monstros que construiram e seguem edificando esse estilo de vida que se tornou esporte olímpico.

E o marco maior dessa realização foi o 2012 IGSA South American Series. Derrubamos as fronteiras de Peru, Colômbia, Argentina e Brasil para levar nosso conhecimento, nosso prestígio, nosso respeito à uma América do Sul sem fronteiras e com isso entraram em nosso Continente os maiores nomes da história do DH Skateboard Mundial, Freeman, Coleman, Rodgers, Kevin, Mischo, Siegriest, Patrick, Kelly, Peer, Stu, Erik, Tom, Jacko, Kate, Bri, Adam, Marcus, Manu, e ajudaram a moldar nossos maiores campeões, Dalua, Guto, Lessa, Silon, Rubim, Brambilla, Yan, Ian, Georgia, Christie, Reine, Melissa, Vitória, Lampião, Tebas, Max, Been, Nei, Pastrana, Lilica, Maia, Zóio, Cobra, Kako, Caco, Fael, e toda a constelação de estrelas que nunca vai deixar de brilhar.

E com tudo isso, minha família cresceu muito, e é ela o que é o mais valioso para mim. Esse reconhecimento, essa admiração, esse respeito de todos é o que o skate me deu de mais grandioso.

Gratidão, muita Gratidão por cada um de vocês.

Gratidão, muita Gratidão Hélio Greco, por me honrar com essas linhas.

Gratidão, toda a Gratidão SKATEBOARD!

 


Ivandro da Silveira 

Nascido em 17/05/71, natural de Novo Hamburgo/RS

Iniciou a andar de skate com 14 anos em 1985, fez parte da geração que retomou o skate no RS depois da destruição do Bowl do Ramon, fazendo parte da construção do primeiro half do Tonel, um dos maiores focos de resistência do vertical brasileiro.

Foi um dos 5 skatistas a representar o RS no GP Brasil de Skate no final dos anos 80 e membro do comitê que reinvindicou o reconhecimento do DH |Skateboard como uma modalidade profissional da CBSK.

Campeão Brasileiro Gran Master DH Skateboard pela CBSK / 2016

Campeão Mundial Gran Master DH Skateboard pela IGSA / 2017